
História das Ideias Políticas
Código
LL127
Departamento
Área de Ensino
Créditos
4
Horas semanais
3
Objectivos
Programa de História das Ideias Políticas
Ano letivo de 2016-2017
Coordenadora: Prof. Doutora Cristina Nogueira da Silva (ancs@fd.unl.pt)
Os direitos fundamentais e a separação de poderes são elementos fundamentais de qualquer Constituição de um Estado de Direito. Quer um, quer o outro conceito, não são transtemporais. Ambos têm uma história, foram conceptualizados em contextos intelectuais e culturais concretos, a partir de tradições herdadas do passado, como sempre acontece quando se procuram soluções políticas ou jurídicas para resolver problemas.
O objectivo desta disciplina é, partindo dos pressupostos anteriormente explicitados, o de reconstituir a história destes e de outros conceitos e ideias do pensamento constitucional contemporâneo através do estudo dos autores liberais clássicos (John Locke, Montesquieu, Benjamin Constant, John Stuart Mill, Alexis de Toqueville). As respostas destes autores aos problemas da sua época - como limitar o poder, como evitar os excessos do poder soberano mas também os excessos do individualismo, como converter os indivíduos em cidadãos - serão o objecto da primeira parte do programa. Para o concretizar será feita uma incursão na doutrina antiga e medieval da “Constituição mista”, sob cuja memória (reconstruída) foram elaborados alguns dos conceitos da doutrina política liberal (o equilíbrio e a limitação do(s) poder(es); a representação política; a garantia das “liberdades”). Será igualmente estudado o pensamento dos primeiros teorizadores da “Razão de Estado” , as “doutrinas da soberania”, de que os autores liberais da primeira metade do século XIX foram simultaneamente herdeiros e críticos. Foi em diálogo com este duplo património intelectual que, por identidade ou por contraste, se constituíram as doutrinas constitucionais-liberais do século XIX.
Na segunda parte do programa serão estudadas os limites do pensamento liberal oitocentista, geradas pela tensão entre o seu registo cosmopolita, universalista e, por vezes, também igualitário e a exclusão política ditada por critérios socioeconómicos, antropológicos e relacionados com pertença nacional. Com a convocação destes limites pretende-se mostrar que o constitucionalismo oitocentista não incorporava todos os conceitos que hoje temos como centrais num Estado de Direito. A associação da democracia ao sufrágio universal ou o direito dos povos à autodeterminação e o correspondente pensamento anti-colonial não integrava a cultura constitucional do século XIX.
No fim, os alunos serão convidados a reflectir sobre os limites do constitucionalismo contemporâneo, quando confrontado com problemas como a emigração ou o acolhimento de pessoas com o estatuto de refugiado.
Temas
1. Apresentação do Programa, Bibliografia, Métodos de Ensino e de Avaliação.
2. Questões teóricas e metodológicas na História das Ideias Políticas.
3. Em torno da ideia de liberdade: “liberdade negativa” e “liberdade positiva” (Isaiah Berlin). A “liberdade antes do liberalismo” (Quentin Skinner). Liberdade e igualdade (Michael Walzer).
4. Aristóteles e a doutrina da “Constituição mista”
5. A Constituição medieval e a supremacia da(s) comunidade(s) política(s):
A “ordem natural” e a limitação intrínseca dos poderes;
Limitação do poder monárquico: o Príncipe justo e o Tirano; o direito de resistência (Jean de Salisbury, 1115-1180);
Limitação do poder monárquico: a “Constituição mista” e o regime político monárquica (S. Tomás de Aquino, 1225-1274); a representação política nas Cortes medievais e modernas.
6. As doutrinas da soberania:
Um poder distinto, originário, indivisível (Jean Bodin, 1529-1596);
Um poder soberano (quase) sem limites (Thomas Hobbes, 1588-1676);
A infalibilidade da vontade geral (Jean Jacques Rousseau, 1712-1778).
7. Liberalismo e limitação do poder soberano (do povo):
A proteção da propriedade e o direito e resistência (John Locke, 1632-1704).
A divisão dos poderes (Montesquieu, 1689-1755);
Direitos individuais, voto censitário, democracia representativa: o primado das liberdades civis sobre a liberdade política (Benjamin Constant, 1767-1830);
A autonomia do indivíduo (John Stuart Mill, 1806-1873);
O critério da utilidade (Jeremy Bentham, 1748-1832; John Stuart Mill);
Descentralização administrativa, liberdade de imprensa, associativismo e “novas aristocracias” (Alexis de Tocqueville, 1805-1859).
8. Limites da cidadania no liberalismo oitocentista: gradações na cidadania
A universalidade dos direitos (Declaração Universal dos Direitos do Homem, 1792); o cosmopolitismo (E. Kant, 1724-1804)
Nacionais e estrangeiros
Cidadãos ativos e cidadãos passivos
Homens e Mulheres
9. Limites do liberalismo oitocentista: a metrópole e as colónias
Nações bárbaras e Nações civilizadas: liberalismo e “multiculturalismo”. As perspectivas de John Locke, Jean-Antoine-Nicolas de Caritat, Marquês de Condorcet, John Stuart Mil e Benjamin Constant.
Livres e escravos
Avaliação:
Trabalho sobre um dos temas do programa, com base na bibliografia recomendada (Suficiente=0; Bom=1; Muito Bom=2).
Teste final com duração de 2 horas
I (50 %)
Responda brevemente (c. de ½ p.) a duas das três seguintes questões.
II (50 %)
Tema para desenvolver ou texto para comentar
Não é permitida consulta de materiais de estudo.
Nos sumários de cada aula e na lista de temas para trabalhos será referenciada a bibliografia específica para cada tema do programa. Serão também disponibilizados, nos “elementos de apoio”, os textos lidos e comentados nas aulas.
Conteúdo
Programa de História das Ideias Políticas
Ano letivo de 2016-2017
Coordenadora: Prof. Doutora Cristina Nogueira da Silva (ancs@fd.unl.pt)
Os direitos fundamentais e a separação de poderes são elementos fundamentais de qualquer Constituição de um Estado de Direito. Quer um, quer o outro conceito, não são transtemporais. Ambos têm uma história, foram conceptualizados em contextos intelectuais e culturais concretos, a partir de tradições herdadas do passado, como sempre acontece quando se procuram soluções políticas ou jurídicas para resolver problemas.
O objectivo desta disciplina é, partindo dos pressupostos anteriormente explicitados, o de reconstituir a história destes e de outros conceitos e ideias do pensamento constitucional contemporâneo através do estudo dos autores liberais clássicos (John Locke, Montesquieu, Benjamin Constant, John Stuart Mill, Alexis de Toqueville). As respostas destes autores aos problemas da sua época - como limitar o poder, como evitar os excessos do poder soberano mas também os excessos do individualismo, como converter os indivíduos em cidadãos - serão o objecto da primeira parte do programa. Para o concretizar será feita uma incursão na doutrina antiga e medieval da “Constituição mista”, sob cuja memória (reconstruída) foram elaborados alguns dos conceitos da doutrina política liberal (o equilíbrio e a limitação do(s) poder(es); a representação política; a garantia das “liberdades”). Será igualmente estudado o pensamento dos primeiros teorizadores da “Razão de Estado” , as “doutrinas da soberania”, de que os autores liberais da primeira metade do século XIX foram simultaneamente herdeiros e críticos. Foi em diálogo com este duplo património intelectual que, por identidade ou por contraste, se constituíram as doutrinas constitucionais-liberais do século XIX.
Na segunda parte do programa serão estudadas os limites do pensamento liberal oitocentista, geradas pela tensão entre o seu registo cosmopolita, universalista e, por vezes, também igualitário e a exclusão política ditada por critérios socioeconómicos, antropológicos e relacionados com pertença nacional. Com a convocação destes limites pretende-se mostrar que o constitucionalismo oitocentista não incorporava todos os conceitos que hoje temos como centrais num Estado de Direito. A associação da democracia ao sufrágio universal ou o direito dos povos à autodeterminação e o correspondente pensamento anti-colonial não integrava a cultura constitucional do século XIX.
No fim, os alunos serão convidados a reflectir sobre os limites do constitucionalismo contemporâneo, quando confrontado com problemas como a emigração ou o acolhimento de pessoas com o estatuto de refugiado.
Temas
1. Apresentação do Programa, Bibliografia, Métodos de Ensino e de Avaliação.
2. Questões teóricas e metodológicas na História das Ideias Políticas.
3. Em torno da ideia de liberdade: “liberdade negativa” e “liberdade positiva” (Isaiah Berlin). A “liberdade antes do liberalismo” (Quentin Skinner). Liberdade e igualdade (Michael Walzer).
4. Aristóteles e a doutrina da “Constituição mista”
5. A Constituição medieval e a supremacia da(s) comunidade(s) política(s):
A “ordem natural” e a limitação intrínseca dos poderes;
Limitação do poder monárquico: o Príncipe justo e o Tirano; o direito de resistência (Jean de Salisbury, 1115-1180);
Limitação do poder monárquico: a “Constituição mista” e o regime político monárquica (S. Tomás de Aquino, 1225-1274); a representação política nas Cortes medievais e modernas.
6. As doutrinas da soberania:
Um poder distinto, originário, indivisível (Jean Bodin, 1529-1596);
Um poder soberano (quase) sem limites (Thomas Hobbes, 1588-1676);
A infalibilidade da vontade geral (Jean Jacques Rousseau, 1712-1778).
7. Liberalismo e limitação do poder soberano (do povo):
A proteção da propriedade e o direito e resistência (John Locke, 1632-1704).
A divisão dos poderes (Montesquieu, 1689-1755);
Direitos individuais, voto censitário, democracia representativa: o primado das liberdades civis sobre a liberdade política (Benjamin Constant, 1767-1830);
A autonomia do indivíduo (John Stuart Mill, 1806-1873);
O critério da utilidade (Jeremy Bentham, 1748-1832; John Stuart Mill);
Descentralização administrativa, liberdade de imprensa, associativismo e “novas aristocracias” (Alexis de Tocqueville, 1805-1859).
8. Limites da cidadania no liberalismo oitocentista: gradações na cidadania
A universalidade dos direitos (Declaração Universal dos Direitos do Homem, 1792); o cosmopolitismo (E. Kant, 1724-1804)
Nacionais e estrangeiros
Cidadãos ativos e cidadãos passivos
Homens e Mulheres
9. Limites do liberalismo oitocentista: a metrópole e as colónias
Nações bárbaras e Nações civilizadas: liberalismo e “multiculturalismo”. As perspectivas de John Locke, Jean-Antoine-Nicolas de Caritat, Marquês de Condorcet, John Stuart Mil e Benjamin Constant.
Livres e escravos
Avaliação:
Trabalho sobre um dos temas do programa, com base na bibliografia recomendada (Suficiente=0; Bom=1; Muito Bom=2).
Teste final com duração de 2 horas
I (50 %)
Responda brevemente (c. de ½ p.) a duas das três seguintes questões.
II (50 %)
Tema para desenvolver ou texto para comentar
Não é permitida consulta de materiais de estudo.
Nos sumários de cada aula e na lista de temas para trabalhos será referenciada a bibliografia específica para cada tema do programa. Serão também disponibilizados, nos “elementos de apoio”, os textos lidos e comentados nas aulas.
Bibliografia
Bibliografia geral:
Maurizio Fioravanti, Constitucion, de la Antigüedad a nuestros días, Madrid, Editorial Trotta, 2001 (leitura obrigatória)
Pierre Manent, História Intelectual do Liberalismo, Lisboa, Edições 70, 2015, pp. 77-103 (Locke) e pp. 103-123 (Montesquieu) (leitura obrigatória).
Diogo Freitas do Amaral, História do Pensamento Político Ocidental, Coimbra, Almedina, 2011.
Bibliografia específica:
Airton Seelaender, « Notas sobre a constituição do direito público na idade moderna : a doutrina das leis fundamentais », in Seqüência, Revista do Curso de Pós-graduação em Direito da UFSC, Ano XXVI, 2006, pp. 197-232 (digitalizado em dir. aulas/ideiaspoliticas/textossecundários).
Alain Renaut (dir), Histoire de la Philosophie Politique, Paris, Calmann-Levy, T. III: «Lumières et Romantisme ».
Alexis de Tocqueville, Da Democracia na América, Cascais, Principia, 2001 (trad. de Carlos Correia Monteiro de Oliveira).
António Manuel Hespanha, “Qu’est-ce que la constitution dans les monarchies ibériques de l’époque moderne”, in Themis, 2000(2001), pp. 5-18.
Cabral de Moncada, Filosofia do Direito e do Estado, Coimbra, Coimbra Editora, 1995.
Cristina Nogueira da Silva, «Progresso e Civilização: povos não europeus no discurso liberal oitocentista», Estudos Comemorativos dos 10 Anos da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa (coord. Diogo Freitas do Amaral, Carlos Ferreira de Almeida e Marta Tavares de Almeida), Coimbra, Almedina, 2008, vol. I
Cristina Nogueira da Silva, "Conceitos oitocentistas de cidadania. Liberalismo e igualdade", in Análise Social, Vol. XLIV (192), 2009.
Diogo Aurélio Pires, Maquiavel & Herdeiros, Lisboa, Círculo de Leitores, 2012.
Ellis Sandoz (ed.), The Roots of Liberty, Magna Carta, Ancient Constitution, and the Anglo-American Tradition of Rule of Law, Indianapolis, Liberty Fund, 1993. BFDUNL: H4-233 (UNLFD).
Filipe Carreira da Silva, Virtude e Democracia, Lisboa, ICS, 2004.
Isaiah Berlin, ‘Two Concepts of Liberty’, in Liberty (ed. Henry Hardy), Oxford, Oxford University Press.
Jacques Revel, “Outillage Mental”, Dictionnaire des Sciences Historiques dir. André Burguiére, Paris, 1986, pp. 372-377.
J.C. Holt, Magna Charta and Mediaeval Government, Cambridge, Cambridge University Press, 2003 (2ª ed.). BFDUNL: DC1-120 (UNLFD)
J.M. Blythe, Ideal Government and the Mixed Constitution in the Middle Ages, Princeton, 1992.
James Tuly, “Rediscovering América: the two treatises and Aboriginal Rights” in G.A.J. Rogers (ed.), Locke’s Philosophy, Content and Context, Clarendon Press, 1994; Jennifer Pitts, A turn to Empire. The rise of Imperial Liberalism in Britain and France, Princeton, 2005.
José Gomes André, José Manuel Santos, Bruno Peixe Dias (org.), Teorias políticas contemporâneas, Lisboa, Sistema Solar/Documenta, 2016.
Juan Manuel Ros, Los dilemas de la democracia liberal, Sociedad civil y democracia en Tocqueville, Barcelona, Editorial Crítica, 2001.
Markku Suksi, Kalliope Agapiou-Josephides, Jean-Paul Lehners and Manfred Nowak (eds.), First Fundamental Rights Documents in Europe, Cambridge, Intersentia, 2015.
Michael Freeden, “European Liberalisms: An Essay in Comparative Political Thought”, in European Journal of Political Theory, 2008.
Michael Walzer, "Equality and Civil Society", in Simone Chambers and Will Kimlicka (eds.), Alternative Conceptions of Civil Society, Princeton and Oxford, Princeton University Press.
Michael Walzer, Thinking Politically, Essays in Political Theory, Yale University Press, 2007 (C1-398).
Mogens Herman Hansen, Polis: an introduction to the Ancient City-State, Oxford, Oxford University Press, 2006 (BFDUNL – H1-276).
Neville Morley, Ancient History, Key Themes and Approaches, London, Routledge, 2000 (BFDUNL: H1-255).
Peter Burke, O Mundo como Teatro, Estudos de Antropologia histórica Lisboa, Difel, 1992.
Pierre Manent, Histoire intellectuelle du libéralisme, Paris, Calmann Lévy, 1987 (trad. port.: Pierre Manent, História Intelectual do Liberalismo, Lisboa, Edições 70, 2015. BFDUNL: C1-422.
Pierre Manent, Tocqueville et la nature de la démocratie, Paris, Fayard, 1982 (C1-285)
Pierre Rosanvallon, Le Sacre du Citoyen, Histoire du Suffrage Universel en France, Paris, Gallimard, 1992 (BFDUNL).
Pietro Costa, Cuidadanía, Madrid, Marcial ons, 2006.
Quentin Skinner, Liberty before Liberalism, Cambridge, C.U.P., 1998 (BFDUNL).
Roger Chartier, “Intellectuelle (Histoire)”, Dictionnaire des Sciences Historiques dir. André Burguiére, Paris, 1986, pp. 372-377.
Sérgio Campos Matos, «Tradition and Modernity in Portuguese Liberal Political Culture”, e_journal of Portuguese History
Uwe Backes, Political extremes: a conceptual history from antiquity to the present; London, New York, Routledge, 2010 (BFDUNL).
William H. Sewell, Jr, “Le citoyen/la citoyenne: Activity, Passivity, and the Revolutionary Concept of Citizenship”, in Keith Michael Baker (ed.), The French Revolution and the Creation of Modern Political Culture, vol. II: “The Political Culture of the French Revolution”, ed. Colin Lucas, Oxford, Pergamon Press, 1988, pp. 105-123, nº 805.
Método de ensino
A avaliação será o resultado da classificação do trabalho de investigação e/ou ficha de leitura e da realização de um exame final.
Método de avaliação
Exposição dos conteúdos acompanhada de comentário de textos originais dos autores seleccionados no programa. Realização, por parte dos alunos, de pequenos trabalhos de investigação sobre temas relacionados com os conteúdos do programa ou de fichas de leitura de livros recomendados numa bibliografia específica organizada por temas.